sábado, 19 de junho de 2010

Bakhtine: A importância do Contexto e das Circunstâncias na inteligibilidade da Mensagem |Pub Objectiva,Subjectiva e Intersubjectiva

O objectivo do presente relatório consiste em fazer uma abordagem à teoria de Bakthine, incluindo as suas implicações para a noção de género, aplicando-as à Publicidade. Nesta medida designaremos os três tipos ideais de géneros: a publicidade objectiva, a publicidade subjectiva e a publicidade intersubjectiva.
No âmbito da publicidade subjectiva surge a expressão discurso difónico. Este discurso reenvia simultaneamente para várias circunstâncias de enunciação distintas. Pode remeter para uma circunstância actual subjacente à concretização do processo de comunicação publicitário ou pode remeter para uma circunstância precedente ao processo de comunicação publicitário que pode nada ter que ver com ele. Relativamente ao discurso difónico iremos apresentar um anúncio ilustrativo do discurso difónico activo, um anúncio ilustrativo do discurso difónico passivo divergente e um anúncio difónico passivo convergente.

Parte I – Bakhtine: A importância do Contexto e das Circunstâncias na inteligibilidade da Mensagem

Para Bakhtine a mensagem publicitária ou o género publicitário é uma actualização de um código (de expressão publicitária). Neste ponto assemelha-se em tudo á teoria de Jackobson. Bakhtine acrescenta que na inteligibilidade da mensagem entram outros factores: as circunstâncias e os contextos. As circunstâncias referem-se aos parâmetros exteriores e interiores relativos ao processo comunicacional que determinam a mensagem. Os contextos estão relacionados com o relacionamento ou com a postura dos interlocutores relativamente a outras produções comunicacionais.
O processo comunicacional decorre das atitudes de questionamento dos interlocutores relativamente às mensagens. Este questionamento pode ser feito quando o locutor se coloca em relação a produções comunicacionais anteriores, ou pode ser feito quando o produtor vê produções ou reacções comunicacionais por parte do destinatário.
Bakhtine vê a mensagem publicitária, não como frase como Jackobson, mas sim como enunciado (Pragmática). Nesta medida, um enunciado publicitário é fluído, em que surgem várias maneiras de justificar o mesmo enunciado, dialógico na medida em que o destinatário se interroga sobre aquilo que realmente se quer dizer. Assim, o interlocutor abandona a posição de agente passivo, sendo um componente importante na compreensão da mensagem. Este replica que o contexto e as circunstâncias/canais de comunicação da mensagem são fundamentais. O destinador tem consciência que o destinatário o pode interrogar e pode subverter todo o processo comunicacional. O enunciado é também uma realidade tripla já que resulta da interacção entre destinador, destinatário e objecto. As modalidades entre sentido e enunciado devem ter em conta os três componentes do processo comunicacional.
Segundo Bakhtine, o processo de comunicação publicitário tem um sentido, é um discurso. Assim, o género apresenta uma dimensão discursiva (para Jackobson o género apresenta uma dimensão linguística e as mensagens são transmitidas e recebidas do mesmo modo).




Parte II - Publicidade Objectiva, Publicidade Subjectiva e Publicidade Intersubjectiva

O facto de existir a conjugação dos três elementos – destinador, destinatário e objecto – vai dar originar os três tipos ideais de géneros publicitários: a publicidade objectiva, a publicidade subjectiva e a publicidade intersubjectiva. Na realidade estes géneros não existem. Existe é a conjugação dos três tipos. Não podemos dizer que um é estruturalmente predominante em relação ao outro.
A publicidade objectiva é totalmente centrada no objecto, mais concretamente no modo como o objecto está posicionado. Há três formas de posicionar o objecto. Assim, o objecto pode estar posicionado numa perspectiva positiva, em que o destinador posiciona o objecto como se fosse uma tentação, valorizando o objecto, levando-o à categoria de objecto de culto; numa perspectiva negativa, em que o objecto é posicionado numa perspectiva negativa. O sujeito detesta o objecto e relaciona-se com ele como se se tratasse de uma abjecção, desprezando-o, conotando-o como algo repulsivo, ameaçador; e, numa perspectiva neutra em que como o próprio termo indica, o objecto é posicionado numa perspectiva neutra. Nesta categoria a mensagem incide nas características do objecto. O destinador em relação ao objecto, apaga-se (como por exemplo, a publicidade informativa).
Na publicidade subjectiva a mensagem reflecte as marcas do destinador. Essas marcas reflectem também as circunstâncias e o contexto em que o processo comunicacional foi desenvolvido. Assenta sempre sobre o objecto e pode ter um valor positivo ou negativo conforme existam estratégias por parte do destinador que passam pelo engrandecimento ou pelo desprezo do objecto.
Em relação à publicidade intersubjectiva, a mensagem comercial é perpassada pelas atitudes do destinatário comercial, isto é, as atitudes do destinatário encontra-se mais ou menos reflectidas explicitamente no enunciado. Este reflexo está relacionado com a forma como o destinador reage ao destinatário. As atitudes do destinatário podem ser de dois tipos: atitudes de natureza económica ou comercial ou atitudes de natureza comunicacional.



Resumindo e esquematizando:

Destinador ð Publicidade Subjectiva ð Tem marcas intertextuais para trás.

Destinatário ð Publicidade Intersubjectiva ð Tem marcas intertextuais para a frente.
Pode ser concebida numa perspectiva positiva (publicidade de tentação) ou numa perspectiva negativa (publicidade de abjecção).

Objecto ð Publicidade Objectiva


O discurso difónico é um conceito essencial em Bakthine. É o discurso produzido por um sujeito no qual a mensagem remete para trás. Deste modo, no âmbito do processo comunicacional, a mensagem/enunciado (E1) reflecte explícita ou implicitamente outros enunciados anteriores (E2, E3,...).
O discurso difónico pode ser activo ou passivo (convergente ou divergente). No que diz respeito ao discurso difónico activo sente-se implicitamente E2. Há reflexos de E1 sobre E2, como se E1 fosse um pressuposto da sua existência. E2 só é percebido através das circunstâncias que estão subjacentes à produção de E1. Assim, E2 está presente especturalmente.

O anúncio I – Herbal Essences - (ver anexos) constitui um bom exemplo do discurso difónico Activo na medida em que há uma estilização visual a propósito da Bela Adormecida. Este conto infantil influencia o anúncio: “Tal como você, o seu cabelo precisa de uma cara-metade, de um Príncipe Encantado. Deixe-se seduzir pelo novo Herbal Essences e verá que a beleza do seu cabelo vai despertar de um sono profundo... da mesma forma que a Bela Adormecida despertou com o beijo do Príncipe.”[1]
O headline justifica/fortifica esta ideia: “Desperte a Beleza Adormecida dos Seus Cabelos”. A imagem da mulher (signo iconografico) vem também reforçar a ligação com a história da Bela adormecida (ver história no anexo II)

No discurso difónico passivo o conceito-chave é reprodução. O discurso difónico pode ser passivo convergente, em que as configurações de E1 são iguais às configurações de E2. Apesar de ser incorporado é algo que é apropriado. A apropriação pode ser lícita ou ilícita. Há uma espécie de imitação mas que nunca é conseguida totalmente: tentamos fazer uma coisa à maneira de “outro” mas não o conseguimos da mesma forma. A reprodução é incorporada para que haja uma convergência de E1 e E2.
Considera-se o anúncio II – Nissan kubistar - (ver anexos) um exemplo de discurso difónico passivo convergente: há a imitação de um regime politica partidário para politizar um carro. Há a projecção de um enunciado anterior (MRPP - Movimento Revolucionário do Proletariado Português) num novo enunciado (Nissan). Existe uma relação de semelhança e de diferença pois existe uma tentativa de imitação de um E2, que nunca é conseguida na sua plenitude – há sempre diferenças (é uma reprodução, não uma cópia “fiel”).
Os murais pintados por essa classe operária tinha um cromatismo muito característico: o amarelo e vermelho; que é transposto para o anuncio. Assim, há uma relação de semelhança e estilo entre os murais e o anúncio.
Há uma necessidade de “impacto”, de fortalecer as características do produto, invocando um partido que mostrou a sua força “trabalhadora”: Nissan Kubistar, uma nova classe trabalhadora (headline). No anúncio são muitos os termos que se “ligam” com os ideiais revolucionários do MRPP: “O Comercial Revolucionário”, “a união da força dos motores”, “regime de baixos consumos”e “tradicional ideologia”.
Ainda é importante referir que o “mural” do anúncio se encontra no local onde estavam os “murais do MRPP”, ainda se vê a Ponte 25 de Abril ao fundo.

No discurso difónico passivo divergente E2 está presente em E1, mas sem lhe alterar as configurações. Nota-se uma diferença entre E1 e E2: existem dois momentos de enunciação. No anúncio III (ver anexos) estes dois momentos aparecem da seguinte forma: primeiro momento – Século XIX, Taiti – e o segundo momento – Século XXI, quando o anúncio foi produzido.
Em relação às diferenças entre E1 e E2, salienta-se a dimensionalidade do quadro (Arearearea-Jovens Taitianas com Flores de Manga – nome do quadro de Gauguin pintado em 1891, Taiti – em anexo) e a tridimensionalidade do modelo (primeiro plano).
Esta tela está carregada da iconografia exótica do lugar onde o pintor se encontrava, e a cena pintada mostra um erotismo natural, fruto da sua paixão pelas nativas (segundo conhecidos do pintor). O cromatismo adquire supremacia pela representação dos vermelhos intensos, amarelos, verdes e violetas, cores que estão presentes também no E1 na roupa da modelo. Existe uma tentativa de aproximação da modelo com as nativas, pois as roupas usadas são parecidas pela sua simplicidade e naturalidade e alguns do tons também coincidem. A própria flor no cabelo da modelo remete para a “Flor de Manga” também presente no quadro de Gauguin.


Conclusão

Com a realização deste relatório pretendemos perceber quais as características principais do discurso Difónico em Bakhtine (Activo e Passivo, dentro do ultimo ainda temos o Passivo Convergente e o Passivo Divergente) e a sua relação com a Publicidade.
Deste modo podemos concluir este relatório resumindo quais as características principais de cada um dos discursos:
- Discurso Difónico Activo: Influência do enunciado anterior
- Discurso Difónico Passivo Convergente: imitação, reprodução de um enunciado anterior, apropriação e transformação de outros discursos.
- Discurso Difónico Passivo Divergente: citação, mais do que reprodução.

Bibliografia


Máxima; Lisboa, Maio de 2004 (188)

Ragazza; Lisboa, Maio de 2004

Visão; Lisboa, Edimpresa, Mês ?, 2004 (…).

Iconografia


Herbal Essences [Desperte a beleza adormecida dos seus cabelos]. s.l., Herbal Essences, 2004

Nissan kubistar [Uma nova classe trabalhadora]. s.l., Nissan, 2004

Elena Miro [Moda Italiana Plus Size]. s.l., Elena Miro, 2004


[1]In: WWW. Herbal-Essences.net

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